Hoje acordei afogada na
superficialidade limitante das pessoas à minha volta. Minha alma, num esgar
desesperado, gritou basta! Sinto falta de você, dos nossos compartilhamentos,
das suas poucas palavras tão cheias do universo...
Não há ninguém que
entenda o envio da lua em seu esplendor no céu, uma orquestra sinfônica, a
imagem de um campo florido, uma peça de Schubert, um seriado intrigante, um
filme emocionante, uma doce canção de ninar. Ninguém sabe me falar dos mistérios
das estrelas ou conhece seus caminhos.... Sem a delicadeza de um café sorvido
com gosto, toda e qualquer outra coisa resta supérflua e deslocada.
Para quem dizer me
abrace, tenho medo ou me lance para que eu desça pelo arco-íris, se não há
braços capazes de me conter? Quem pode me segurar se ao final e a cabo, todos
são tão menores que eu??? Só você era maior, capaz e forte suficiente para me
suster nesse delicado bordado da vida onde agora voo como uma folha solta ao
vento...
Seguro-me nas lembranças
e enquanto jogam pedras de descaso no meu oficio, seus olhos brilhantes repetem
na minha memória a frase curta, quase simplória, mas que me alenta a cada dia:
minha advogada! E no meio de uma imensidão de tantos faz, ainda julgo escutar
um homem que dizia nunca pensei em
namorar uma advogada, a minha advogada... E os braços que me elevaram acima
da espuma macia, transmitiram, à minha alma, uma confiança que ainda me segura.
Sem sua ponta seca, inútil é meu compasso. Não
sabe mais traçar os arcos de uma vida que ficou sem cor, sem sabor, como um sal
que já não salga, apenas seca.
A quem ainda posso
perguntar qualquer coisa, perscrutar qualquer assunto sem jamais me encabular,
envergonhar ou me sentir menor? Com quem falar sobre sexo, politica, esportes,
estrelas e música, medos, desejos sem medo? Apartada da sua inesgotável
profundidade já não sou uma das meninas de Renoir: Não há tela capaz de me
refletir, como não há braços capazes de me abraçar porque não basta ter
envergadura física, mister Ser Capaz de o fazer.
Hoje acordei cansada das
superficialidades das palavras vãs e desejei vê-lo tocar a companhia e entrar,
sentar-se para um café e apenas degustar o suave prazer de lhe olhar.... Se
tivesse coragem – será que teria? – Apenas pedir: Me abraça? Nada mais...
Talvez estendesse,
tímida, a ponta dos dedos para tocar seu cabelo macio – sinto tanta falta de acaricia-lo,
sentir-lhe o perfume, o cuidado – mas a vontade mesmo seria de beijar sua boca
macia e quente que costumava tocar-me a alma...
Já nem ouso imaginar
como seria ter novamente seus dedos tamborilando aquela suave canção, mas ainda
sinto o cheiro fresco de sua pele sobre a minha quando enterro o rosto entre os
travesseiros tentando, inutilmente, encontrar a barba, o peito e o olhar ...
O que eu não daria para
o ter de volta? Não sou capaz de imaginar nada que eu não pudesse trocar: anos
de vida, qualquer tipo de fortuna, tudo eu entregaria se o pudesse novamente
reconquistar.
Nem bem me lembro das conjunções
porque ao evocar tais imagens, ao ver seu corpo projetado na tela da memória,
sempre paro nos seus olhos que iam se apertando, as pupilas pequeninas como se
abraçassem forte a imagem que refletiam e meus olhos turvos, nesses momentos,
chamam seu nome sem conseguir se conformar.
A ausência dói como
jamais imaginei que algo doeria. Não ter você é como se faltasse uma parte
essencial de mim, como se o próprio Deus – à guisa do que fez a Jó – me estivesse
testando a resistência e sanidade: cada dia de uma vez e uma esperança louca e
desarrazoada de que um dia eu vou acordar e ao abrir os olhos novamente lhe
ver...