Sou
uma apaixonada pela obra criativa de Deus de uma forma geral, mas as diversas
capacidades do ser humano me espantam a cada dia... Como somos capazes de
incorporar fatos, sabores, odores, acontecimentos, pessoas, a nós mesmos sem
sequer percebemos o processo!
Dias
atrás, tentei, inutilmente, diga-se de passagem, lembrar seu cheiro. Lembrava-me
perfeitamente do nome do seu perfume, das sensações que o contato com sua pele
me provocava, mas a forma como meu cérebro identificava essa mistura única e
peculiar formada, de uma forma exclusiva, pela química do seu corpo ao reagir aos
compostos odoríferos do seu perfume, isso a que chamamos de cheiro, não
consegui lembrar!
Deveria
ser possível guardar os aromas em potinhos bem fechados para que pudéssemos aspirar
em momentos de saudade extrema, assim como posso recorrer às
fotos quando a
vontade de lhe ver bate os píncaros da vontade ou nos assalta o medo de ver o
registro da sua amada face ser sobreposta por tantos outros registros diários..
Guardo, com ciúme infantil, pequenos e raros áudios por meio dos quais posso
sempre verificar que ainda sei exatamente como é a sua voz, mas o cheiro, ah! O
cheiro não tem como guardar...
O
fantástico foi que entendi tudo de forma instintiva, sem passar pelo
entendimento, pela mente, pelo racional... Foi o coração disparado, o corpo
trêmulo, os joelhos duvidosos em sua capacidade de suster o corpo que me
explicaram que reconheci pairando no ar sua assinatura olfativa!
O
mais interessante foi que não havia ninguém por perto, não passou de uma ilusão
olfativa, um delírio de saudades, diriam alguns, que teve o efeito potencializador de aumentar ainda mais a falta que sinto de você!
Em
tudo isso, surpreende-me observar que transcorridos mais de quatro anos desde
que você decidiu afastar-se de mim, tudo ainda é perfeitamente atual:
recordo-me de você como se houvéssemos nos visto semana passada e a saudade dói
como se tudo acontecera ontem... A regra de que o tempo é o pai do esquecimento
não se aplica a mim: levo você por onde vou!
Quantas saudades eu sinto do meu melhor e maior amigo e, claro, do meu namorado e do seu sorriso e do seu cheiro gostoso e do seu abraço enorme onde sempre me coube tão perfeitamente
Sujeito-me
ao respeito que devo a sua decisão, mas insurjo-me face ao desconhecimento dos
seus fundamentos – talvez essa a dor mais profunda, a de não saber porque – e a
consequente impossibilidade de corrigir um eventual erro meu.
A
angustia inicial transmutou-se em resignação e agora apoia-se na esperança de uma
possível reconsideração, algum dia, afinal, tudo sempre pode mudar!
Sigo descendo a rua. O sol mergulha no horizonte tingindo o céu de um gradativo negrume. As lágrimas também se recolhem enquanto me dirijo à condução.
No
meu ser existe um lugar, cuja porta nunca se fecha, e que tem por nome saudade.
Bem na entrada há uma placa onde se lê: você!
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